Diário de Bordo de Marcos Freitas

A Pior Viagem de Todas

Dia 31 de Novembro de 1807

Hoje, dois dias depois de ter embarcado, eu escrevo com detalhes a partida de minha amada Lisboa para, literalmente, onde é o fim do mundo. Eu e meus companheiros estamos a caminho do Rio de Janeiro, Brasil.
Tudo começou em agosto desse ano, quando o nosso príncipe regente, Dom João, iniciou a discussão sobre uma estratégia alternativa que, muitas vezes no passado, tinha sido examinada sempre que uma crise viesse a abalar o país - a transferência da Família Real Portuguesa, Corte e Capital para o outro lado do Atlântico, para o Brasil. Desta vez, seria diferente; a estratégia não só seria amplamente debatida, mas também implementada! 
Acredite organizar uma viagem levando uma Corte inteira para o outro lado do mundo e ainda, sem transparecer o que estava acontecendo, não foi uma tarefa fácil nem pode ser realizada de um momento para outro.O príncipe regente Dom João raciocinou de que sua melhor opção seria a transferência da Família Real e Corte. Os preparativos então começaram; ele mandou aprontar as naus Afonso de Albuquerque, Medusa e Conde Dom Henrique, que se encontravam em Lisboa; ordenou à Esquadra, que se ocupava em proteger a frota mercante de piratas nos Estreitos de Gibraltar, a voltar ao estuário do Tejo. 
Em novembro de 1807 com a retirada dos representantes da França e da Espanha, a pressão aumentou. Boatos que o Exército Francês viriam invadir Portugal nos forçou, muito contra a nossa vontade, a aprovar medidas contra os súditos britânicos. Lord Strangford retirou as armas do prédio que ocupava e, na tarde do 18 desse mês, acompanhado por auxiliares e os arquivos transferiu-se para a nau London. Enquanto isso na Inglaterra os termos do Convênio assinado com Portugal começaram a ser implementados. No dia 11 uma esquadra, sob o comando do Contra-Almirante de pavilhão azul Sir Sidney Smith, partiu da base de Plymouth. 
Em 16 do mesmo mês, a esquadra encontrava-se a postos patrulhando a foz do Tejo. As notícias de Lord Strangford com evidências inequívocas de hostilidades, fez com que fosse declarado o bloqueio do Tejo. Todos os navios estrangeiros seriam revistados e aqueles de nacionalidade francesa ou espanhola, apreendidos e tambem o Cônsul-Geral Mr. Gambier, tentava liberar os prisioneiros de guerra britânicos. Em 21 de novembro partiu num brigue português e juntou-se à esquadra. Desde o dia 9, o Príncipe Regente havia confirmado a nomeação, por Lord Strangford, de John Bell, para desempenhar as funções de: “…agente para prisioneiros de Guerra britânicos…”. 
Dia 24, quando uma forte tempestade do dia anterior tinham diminuído, a corveta Confiance, Capitão James, largou para Lisboa a fim de entregar este importante documento para assuntos importa da “aliansa” de portugal e Inglatera da qual eu n tive asseso, porem o momento de preucupasao viria os bostos se comfirmaram pois nas fronteira de portugua o exército françes estava a caminho. Sem auternativa o jeito abandona o povo  e ir para o brasil
À tarde do dia 27, a Família Real embarcou na nau Príncipe Real: Dona Maria I, Dom João, os Infantes Dom Pedro e Dom Miguel e o Infante da Espanha Dom Pedro Carlos; na nau Afonso de Albuquerque: Dona Carlota Joaquina, com suas filhas, as Infantas Dona Maria Isabel Francisca, Dona Maria d’Assunção, Dona Ana de Jesus e Dona Maria Tereza; na nau Príncipe do Brasil: a Princesa viúva Dona Maria Francisca Benedita e a Infanta Dona Maria Ana, ambas irmãs da Rainha; e na nau Rainha de Portugal: as filhas de Dona Carlota Joaquina, as Infantas Dona Maria Francisca de Assis e Dona Isabel Maria.
O embarque dos demais foi, compreensivelmente, muito tumultuado. Faltava a experiência de como embarcar milhares de pessoas; a grande maioria, provavelmente, pela primeira vez. O que levar, o que deixar – sem saber por quanto tempo estariam ausentes das suas casas ou mesmo se um dia voltariam. O medo do Exército que se aproximava, a angústia dos parentes que ficavam – tudo debaixo de uma chuva incessante, muita pessoas importantes como Núncio Apostólico, Monsenhor Caleppi, não conseguiriam nem embarcar por falta de espaço. Outros, como Dom Pedro de Sousa Holstein, futuro Duque de Palmela, foram obrigados a voltar a terra, depois de embarcar.O Lord Strangford, na véspera da partida, com muita dificuldade porque o vento começava a virar, entrou no Tejo e encontrou-se com Dom Antonio de Araújo de Azevedo, a bordo da nau Medusa. Ouve buatos no meu naivio que o nosso coragoso prisipe regente teve que ser verdado por medo de trovoes.
Na noite do dia 28 o vento mudou de direção, de noroeste para sueste, permitindo a saída do Tejo. Na madrugada do dia 29, as naus começaram os preparativos finais para a viagem. Uma mensagem recebida no meu navio dizia que 18 horas depois, Junot, comandante das tropas francesas, alcançaria Lisboa. 
As naus Medusa e Martim de Freitas lideraram a Esquadra para fora do rio, deliberadamente passando junto à Esquadra Imperial Russa fundeada próximo à entrada da barra, a fim de avaliar suas intenções e observar possíveis reações. Depois foi a vez daquelas naus que transportavam membros da Família Real alcançarem aquele trecho do rio. A nau Martim de Freitas levava o prático do rio até a barra. Como não houve como retorná-lo, o mesmo viajou até o Brasil! 
Graças a Deus ao atravessar a barra do Tejo naquela manhã, a Real Esquadra Portuguesa encontrou-se com a Real Esquadra Britânica, como combinado. Este esperava velejando em linha de batalha. Após ter recebido o sinal “preparar para batalha” da nau-capitânia, todas as naus tinham sido transformadas em máquinas de guerra, com seus marinheiros e fuzileiros guarnecendo as peças, prontos para o combate e nos levar em segurança ao Rio de Janeiro. Sir Sidney não estava disposto a correr qualquer risco. Após um diálogo amistoso a bordo do Príncipe Real, a troca de salvas previamente negociada ocorreu às quatro e meia da tarde. Infelizmente a nau Príncipe Real não participou devido à enfermidade da Rainha. Toda Esquadra foi velejando rumo ao noroeste, pois os ventos de uma tempestade do sueste não permitiam outra alternativa. Para abaixar o centro de gravidade, as peças mais altas dos mastros foram desarmadas e amarradas no convés. Esse rumo era mais confortável e menos perigoso, do que aproar as naus rumo à Ilha da Madeira e receber o mar de través, mesmo assim, ficaram submetidos à arfagem.Segundo o comandante da nau-capitânia britânica Hibernia, ao anoitecer foram registradas 56 velas à vista. 
Imaginavam que a Esquadra, naquele momento, velejava em direção ao Brasil. O rumo verdadeiro não poderia ser visto da terra! Naquela ocasião, fuzileiros das naus Hibernia, Marlborough e London foram transferidos para a fragata Solebay e as corvetas Confiance e Redwing tentavam sem sucesso, devido ao mau tempo, capturar o forte do Bugio.

Dia 33 de Novembro de 1807

Ontem com a mudança da direção do vento, foi possível alterar o rumo. Nas primeiras horas da tarde de hoje, atravessamos a latitude de Lisboa navegando em direção à Ilha da Madeira. Éramos no total 57 velas, sendo 18 de guerra portuguesas, 13 britânicas e 26 mercantes. 

                                               ...

Dia 5 de Dezembro de 1807

Hoje estávamos navegado meio-caminho entre Lisboa e Funchal, parte da Esquadra Britânica, após a salva da Hibernia respondida pela Conde Dom Henrique, alterou rumo para voltar ao bloqueio de Lisboa. A Esquadra Portuguesa seria escoltada até o Brasil por uma esquadra de quatro naus: Marlborough, London, Bedford e Monarch, sob o comando do Comodoro Graham Moore.  
Mais tarde Lord Strangford que até então tinha acompanhado a Esquadra a bordo da Hibernia, adoentou-se e voltou à Londres. Lá ele contou uma historia dizendo que a Família Real transferiu-se para o Brasil, devido a sua influência. Mais tarde retratou esta versão dos eventos. Com o Governo estabelecido no Rio de Janeiro, foi Ministro Plenipotenciário
     
Comunicação a distância: Carlota reclamava de tudo; João, instalado em outro navio, tentava aplacá-la em bilhetes despachados em botes  

                                               ...

Dia 10 de Janeiro de 1808

Hoje, lá pelas 11 horas da manhã, a frota que levava a corte portuguesa para o Brasil, cruzou a linha do Equador. A rainha D. Maria I e o príncipe regente D. João tornavam-se os primeiros monarcas europeus a passar para o hemisfério austral e isso não foi algo que os alegrou.Hoje tambem a nau Hibernia, por ordens de Sir Sidney, transferiu a lancha do Almirante para a Príncipe Real, e as seguintes provisões para a Rainha de Portugal: 13.440 libras de pão em 120 sacos, 1.136 peças, de oito libras cada, de carne de boi e 1.570 peças, de quatro libras cada, de carne de porco e 54 alqueires de ervilhas secas. Marlborough embarcou 43 toneladas de água salgada para compensar a água e mantimentos consumidos desde a sua partida de Plymouth.  

Dia 11 de Janeiro de 1808


Hoje a nau London recebeu 69 passageiros da nau Príncipe Real, outros foram transferidos para a Monarch. Capitão James Walker reportou ao Almirantado que a Príncipe Real velejava com 1.054 pessoas a bordo. Assim, caso a guarnição de 950 homens estivesse completa, o número de passageiros seria então, de 104 pessoas. 

Naquela noite, escoltado pelo brigue Voador, London pôs-se a caminho de Funchal, para lá fazer a guarda. 

                                                ...

Dia 20 de Janeiro de 1808

Ontem, aproximadamente há 50 léguas ao norte da Madeira, com receio de aproximar-se, à noite, de um perigo conhecido como ‘Oito Pedras’, a Esquadra Portuguesa atravessou. As naus Marlborough e Monarch também pararam. 

Na noite de ontem a visibilidade era muito reduzida devido à chuva, assim mesmo as naus Príncipe Real e Afonso de Albuquerque, sem dar qualquer sinal, partiram com suas fragatas rumo noroeste. Novamente o vento soprava do sueste. O resultado foi que, na manhã seguinte, encontravam-se velejando escoteiro; a nau Príncipe Real com a fragata Urânia, Afonso de Albuquerque com a fragata Minerva e a Bedford. Ainda paradas no mesmo local estavam as naus Rainha de Portugal, Conde Dom Henrique, Marlborough e Monarch. 

Anteriormente, as demais naus tinham obtido permissão de Dom João, para seguirem viagem independentemente para o Brasil. 

Todos os comandantes agora tomaram a mesma decisão. Partiram para os rendez-vous previamente combinados; sucessivamente, oeste da Madeira, ao largo da Ilha de Palma e Praia, na Ilha de São Tiago 
Hoje tambem ficamos sabendo de uma carta da qual eu quis coloca um pedaço:
“ A 11 de dezembro, as naus Príncipe Real e Afonso de Albuquerque, que basicamente tinham seguido o mesmo rumo, reencontraram-se. A 14 de dezembro, Bedford, após ter passado 36 horas ao largo da Ilha da Madeira e enquanto aguardava perto da Ilha de Ferro, finalmente avistou-as e, no dia seguinte, pôde anotar que viajavam ‘em conserva’. 

A 21 de dezembro Dom João informou ao Capitão James Walker que tinha decidido ir, sem parar, ao Brasil. O andamento da Esquadra era razoável e não faltava água ou mantimentos. Naquela noite, a fragata Minerva fora enviada à São Tiago para avisar os demais navios da decisão do Príncipe Regente. 

As quatro naus, que tinham passado a noite paradas perto da Madeira, entraram para fazer aguada em São Tiago a 24 de dezembro e lá encontraram a Minerva. A London, que tinha sido enviada para fazer aguada em Madeira, fundeou dois dias depois. 

A 27 de dezembro, de Cabo Verde, partiram com destino a Cabo Frio, distante 823 léguas. Tinham conhecimento que as naus, com a Família Real, velejavam num rumo paralelo ao leste. Assim, diariamente ao alvorecer, Monarch recebia sinal para deslocar-se para o horizonte no sueste. À noitinha, recebia sinal para voltar, evitando perder-se na escuridão. 

A 2 de janeiro de 1808, Bedford reportou que estava avistando três naus no horizonte. Um vento fraco e o fato de que era a única nau de escolta junto à Família Real, impedia-a de investigar. Naquela noite, uma luz azul fora colocada no topo do seu mastro real. Esta foi a única ocasião, após 8 de Dezembro, em que o ascender de uma luz azul foi anotado. O livro de quartos da Marlborough registra, às 11:30h da noite, a presença de uma luz azul no horizonte.

                                                 ...


As naus com a Família Real a bordo, aproximando-se do equador, entraram numa área de calmarias. Levaram dez dias para galgar trinta léguas. O progresso lento - mesmo depois de ter ultrapassado esta área de calmarias, pois o vento soprava do sueste - somado ao fato que a Afonso de Albuquerque era uma nau ronceira, contribuíram para que Dom João dessidese mudasse seus planos; já se encontravam há 7 semanas no mar. Às 1:20h da tarde de 16 de janeiro, o cúter da Bedford deslocou-se até a Príncipe Real; recebeu ordens de alterar o rumo, pois a decisão tinha sido tomada de ir a Salvador. ”

                                                   ...

    
O London, um dos quatro navios ingleses destacados para escoltar a esquadra portuguesa: na altura da Ilha da Madeira, nevoeiro e separação  

Dia 10 de Março de 1808

No dia  22 de janeiro, portanto após 55 dias no mar, finalmente fundearam em Salvador. A primeira etapa da viagem havia terminado. Alguns dias antes, 17 de janeiro, a divisão da Esquadra que tinha velejado diretamente de São Tiago, após aterrar em Cabo Frio, entrou na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro. 

Aos poucos, todas as naus foram chegando: Medusa, bastante avariada, atracou no Recife em 13 de janeiro; Dom João de Castro, danificada e fazendo água, fundeou, no início daquele mês, na Enseada de Lucena; Martim de Freitas, após breve estadia em Salvador, arribou no Rio de Janeiro em 26 de janeiro; Príncipe do Brasil chegou no Rio de Janeiro em 13 de fevereiro portanto, um atraso de quatro semanas, pois teve que se dirigir primeiro à Inglaterra para reparos. Antes, porém, as irmãs da Rainha foram transferidas para a nau Rainha de Portugal. 
 
No dia 7 de março, a família real finalmente chegou ao Rio de Janeiro, a nova capital do império. Apos a sua chegada, por não ter palácio para recebê-los, varias casas grandes foram reformadas e seus donos expulsos por necessidades da corte.
Enfim, embora severamente castigadas pelas sucessivas tormentas de inverno, que causaram avarias consideráveis, todas as naus chegaram ao seu destino. E assim terminava a nossa vigem até o fim do mundo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário